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quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A INFÂNCIA DE ABRAHAM LINCOLN - Por ele mesmo.

           

  Foi escrito pelo próprio Abraham Lincoln

                 "Nasci em 12 de fevereiro de 1809, perto de onde é hoje Hogginsville (Hodgenville), em Kentucky. Meus pais eram ambos da Virgínia. Minha mãe, que morreu quando eu tinha dez anos, era de uma família chamada Hanks. Meu avô, Abraham Lincoln, veio da Virgínia para Kentucky  em 1781 ou 82. Um ano ou dois mais tarde, ele foi morto pelos índios, quando tentava organizar uma fazenda na floresta. Meu pai, na ocasião da morte de meu avô, não tinha mais que seis anos e cresceu sem instrução nenhuma. Mesmo na infância, foi um trabalhador ambulante, que nunca aprendeu  escrever mais que o próprio nome. 
                 1813. Thomas Lincoln arrenda uma fazenda em Knob Creek, Kentucky. Deste lugar eu me lembro muito bem. Minha mais remota recordação é daí. 
              1814. Antes de deixar Kentucky, eu e minha irmã fomos enviados, por períodos curtos, à escola de ABC. 
             1815. Com armas inofensivas - simples paus de nogueira - Austin Gallaher e eu tínhamos estado brincando e caçando coelhos nos bosques. Depois de algumas horas de vigoroso exercício físico, tínhamos parado para descansar. Logo atirei fora o meu chapéu, trepei numa árvore e fiquei descansando confortavelmente numa forquilha de dois ramos. 
                  Embaixo, estendido na grama, estava Austin, aparentemente adormecido. A seu lado, um boné de boca para cima. No bolso de meu colete, eu tinha uma fruta que encontrara pouco antes. O pensamento que, repentinamente, me ocorreu foi de que seria engraçado deixá-lo cair dentro do boné de Austin. 
                   A fruta estava tão madura e mole que eu, com dificuldade, consegui retirá-la inteira de meu bolso. Fazendo cuidadosa pontaria, deixei-a cair. Tinha calculado muito bem, pois acertei no meio do boné e vi pedaços de fruta mole e amarela salpicarem em todas as direções. Fiz uma pausa para observar o resultado, convencido de que Austin ficaria zangado, mas, estranho como pareça, o que eu tinha feito para irritá-lo não surtira efeito. 
                 Desci da árvore logo depois. Imaginem a minha surpresa: quando alcancei o chão compreendi que, em vez de dormir, Austin estivera na realidade acordado. Enquanto eu trepara na árvore, ele havia habilmente trocado os bonés, substituindo o dele pelo meu. Assim, em vez de aborrecê-lo como tinha pretendido, eu havia simplesmente sujado o meu próprio boné. 
                 1816. Nossa fazenda era composta de três campos que se estendiam pelo vale, cercado por altas colinas e profundos desfiladeiros. Algumas vezes, quando batia uma chuva forte nas colinas, a água invadia os desfiladeiros e estendia-se pela fazenda. A última coisa que me lembro de ter feito numa tarde de sábado. Os outros meninos plantaram milho no que chamávamos "o campo grande", pois tinha sete acres, e eu espalhara sementes de abóbora. Eu plantara duas sementes em fileiras alternadas, um montinho sim, outro não. Na manhã do domingo seguinte, veio uma grande chuva das colinas. No vale não choveu uma gota, mas a água, vinda através das gargantas, lavou o solo, o milho, as sementes de abóbora e todo o campo. 
               Lembro-me de nossa vida no Kentucky; a choupana, a maneira difícil de viver, a venda de nossas propriedades e a viagem que empreendi com meu pai e minha mãe para o sul de Indiana. Fomos para o que é hoje Spencer Country, em Indiana, quando eu tinha oito anos.
                 Outono de 1816.  Thomas Lincoln e sua família estabelecem-se em uma terra agreste perto de Pigeon Creek, não longe de Rockport, em Indiana. Estabelecemo-nos em uma floresta virgem e a abertura de uma clareira foi a grande tarefa a enfrentar. Eu era desenvolvido para a minha idade e logo me puseram um machado nas mãos. Desde esse tempo até meus vinte e três anos, estive constantemente manejando este utilíssimo instrumento. 
               Fevereiro de 1817. Nosso lar ficava numa região bravia, com muitos ursos e outros animais ferozes ainda pelas selvas. Aí comecei cedo a caçar, o que jamais soube fazer com perfeição. Alguns dias antes de fazer nove anos, na ausência de meu pai, um bando de perus selvagens aproximou-se de nossa cabana de madeira. Eu estava em pé, dentro, e com uma espingarda atirei através de uma fenda, matando um deles. Desde então nunca mais puxei o gatilho para coisa mais importante.  
                 Aqueles tempos de início, em Indiana, foram bem difíceis. Tivemos de construir a cabana e limpar o terreno para as colheitas. Mas, logo depois, conseguimos um conforto razoável. 
              5 de outubro de 1818. Falecera minha mãe.
               1819.  Levei um coice de cavalo e estive aparentemente morto por algum tempo. 
              2 de dezembro. Meu pai casou-se com a Sra. Sally Johnston, viúva com três filhos, de Elizabethtown, em Kentucky. Ela foi uma boa e carinhosa mãe para mim. 
              1820.  Existiam algumas escolas, pelo menos, tinham esse nome, mas para as quais se exigia dos professores que soubessem ler, escrever e calcular até regra de três. Se um desocupado, que tivesse fama de saber latim, aparecesse na vizinhança, seria olhado como feiticeiro. Frequentei a escola elementar por pouco tempo.  Agora acho que todo o meu período escolar não chegou a um ano. 
extraído de um caderno > Abraham Lincoln, a pena manuseado, -   Será bom, mas só Deus sabe quando.
             1821 (?). Entre minhas mais remotas lembranças, recordo-me como, ainda bem criança, costumava ficar irritado, quando alguém falava comigo de um modo que eu não pudesse entender. Vejo-me indo para o quarto, depois de ouvir a conversa dos vizinhos com meu pai, uma tarde. Devo ter gasto grande parte da noite tentando compreender a exata significação do que tinham dito. 
                Quando me acontecia começar a buscar uma ideia, eu não podia dormir enquanto não a achasse. E quando pensava que a tinha obtido, não ficava satisfeito até que a tivesse repetido muitas vezes. Enquanto pensava, tinha que expressá-la em linguagem suficientemente simples para qualquer menino, dentre os meus conhecidos, poder entendê-la. 
                 Um dia, uma carroça quebrou-se perto de nós. Nela estavam uma senhora, duas crianças e um homem. Enquanto eles ali estiveram, cozinharam em nossa casa. A senhora tinha livros e lia histórias para nós. Tomei-me de grande afeição por uma das meninas e quando eles se foram pensei nelas com grande saudades.
               Um dia, quando eu estava sem ter o que fazer, escrevi uma história mentalmente. Imaginei que tomara o cavalo de meu pai, seguira a rota da carroça e, finalmente, a encontrara. Falei com a menina e persuadi-a a fugir comigo. E, naquela noite mesmo, eu a pus em meu cavalo e galopamos através dos prados. Depois de algumas horas, chegamos a um campo. E ao passarmos por ele, reconhecemos que era o mesmo que havíamos deixado horas antes. Desistimos naquele dia, mas na noite seguinte tentamos nova fuga e a mesma coisa aconteceu. O cavalo voltava sempre ao mesmo lugar. Então, resolvemos que não devíamos fugir. Esperaríamos até eu persuadir seu pai a dar-me a filha....
                Sempre pretendi escrever esta história e publicá-la. Cheguei a começar uma vez, mas compreendi que não era bem uma história,e sim o começo do amor para mim. 
                No começo de minha infância, logo que aprendi a ler, consegui um livrinho: a "Vida de Washington", de Weem. lembro-me de ter lido sobre as batalhas pela liberdade do país. Nenhuma outra se fixou em minha imaginação tão profundamente como a de Trenton, Nova Jersey. A travessia do rio, a contenda com os hessos, as agruras suportadas naquele tempo, tudo se gravou em minha memória mais do que qualquer acontecimento singular da Revolução. Revejo-me pensando, então, como verdadeiro menino que eu era, que devia ter havido alguma coisa de muito importante para que esses homens combatessem. 
                1827.  Ele encarrega-se de fazer navegar um barco através do Ohio, a dezesseis milhas de sua casa. Eu observava um novo barco e  meditava se poderia fazê-lo mais forte ou aperfeiçoá-lo de qualquer forma. Dois homens vieram da praia, em carruagem, com malas. Depois de olharem os diferentes barcos, escolheram o meu. Perguntaram:
                  - A quem pertence este? 
                 Eu respondi, um tanto modestamente: 
                  -  A mim. 
                  - Poderia, disse um deles, levar-nos ao vapor? 
                  - Certamente, respondi. 
                  Estava contente de ter uma oportunidade de ganhar alguma coisa. Supunha que cada um me daria duas ou três moedas. Remei até o vapor. 
                 Eles subiram à bordo, eu suspendi suas pesadas malas e as pus no convés. O vapor estava quase partindo, quando reclamei que eles se tinham esquecido de me pagar. Cada um tirou do bolso meio dólar de preta e o atirou ao chão de meu barco. Mal podia acreditar que eu, um pobre menino, tinha ganho um dólar em menos de um dia. O mundo pareceu-me mais formoso e amplo. Fiquei mais esperançoso e confiante a partir desse momento. "

"Esta é uma adaptação de An Autobiography of Abraham Lincon, compilada por N. W. Stephenson." 
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Nicéas Romeo Zanchett 
          


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