IMPOSTOS E LIBERDADE
DOS RENDIMENTOS DO ESTADO
Os rendimentos do Estado são uma parte que cada indivíduo dá dos seus haveres para ter a segurança da outra, ou para gozar dela agradavelmente.
Para fixar bem estas receitas é preciso tem em vista não só as necessidades do Estado, mas também as dos cidadãos. Não se deve tirar para as necessidades imaginárias do Estado aquilo que o povo aplica às suas necessidades reais.
As necessidades imaginárias são as que provem das paixões e dos erros dos governantes, da fascinação dum projeto extraordinário, do desejo desordenado duma vã glória e de uma certa impotência do espírito contra as fantasias. Muitas vezes aqueles que dirigem os negócios públicos, julgaram que eram necessidades do Estado as necessidades de suas almas mesquinhas.
Nada requer mais sabedoria e prudência do que a relação entre a parte de que o cidadão é desprovido e a que se lhe deixa.
Não é pelo que o povo pode dar que é preciso regular as receitas públicas, mas pelo que ele deve dar; E se as regulam pelo que ele pode dar, é preciso que se considere pelo menos o que pode dar constantemente.
Viu-se em certas monarquias, que pequenos Estados isentos de tributos, eram tão miseráveis como os subjacentes que estavam sobrecarregados com eles.
A principal razão de isto é que o pequeno Estado encravado não pode ter indústria, artes, nem manufaturas, por causa de estar sujeito a mil restrições da parte do grande Estado no qual está encravado. O grande Estado que o cerca tem indústria, manufaturas e artes; e faz regulamentos que lhes dão todas as vantagens. O pequeno Estado torna-se necessariamente pobre, por muito pouco impostos que nele se lancem.
Concluiu-se todavia da pobreza destes pequenos países, que para que o povo seja industrioso são necessários encargos pesados. Seria melhor que se concluiu-se que não eram precisos nenhuns. Vivem ali todos os miseráveis das proximidades que procuram aqueles lugares para não fazerem nada; desalentados pelo cansaço do trabalho fazem consistir toda a sua felicidade na sua preguiça.
O resultado das riquezas dum país é encher de ambição todos os corações. O resultado da pobreza é fazer nascer o desespero. A primeira irrita-se pelo trabalho, o outro consola-se pela preguiça.
A natureza é justa para com os homens, recompensa-os dos seus trabalhos; torna-os laboriosos; onde há maiores trabalhos ela concede maiores recompensas. Mas se um poder arbitrário tira as recompensas da natureza, torna-se avessa ao trabalho e a inação parece ser o único bem.
COMO SE CONSERVA A ILUSÃO
Para que o preço das coisas e os direitos possam confundir-se no pensamento de quem paga, é preciso que haja alguma relação entre a mercadoria e o imposto, e que sobre um gênero de pouco valor, se não lance um imposto excessivo. Há países em que os direitos excedem dezessete vezes o valor da mercadoria. Neste caso o monarca tira a ilusão aos seus súditos; estes veem que são conduzidos duma maneira que não é razoável; o que os faz sentir a sua servidão ao último extremo.
De mais, para que o monarca possa lançar um direito tão desproporcionado com o valor da coisa, é preciso que ele próprio venda a mercadoria, e que o povo a não possa ir comprar em outra parte; o que está sujeito a mil inconvenientes.
Sendo a fraude neste caso muito lucrativa, o castigo natural, o que a razão requer, que é a confiscação da mercadoria, torna-se incapaz de a impedir; tanto mais que essa mercadoria é de ordinário de um valor muito desprezível. É preciso pois, recorrer a castigos extravagantes, e semelhantes aos que se infligem para os maiores crimes. Desaparece desse modo toda a proporção entre os castigos. Pessoas que não seriam consideradas como más, são punidas como criminosas; o que é a coisa mais contrária ao espírito de um governo moderado.
Acrescento que quanto mais se põe o povo em circunstâncias de defraudar o arrematante, tanto mais se enriquece este, e se empobrece aquele. Para impedir a fraude é preciso dar aos arrematantes meios de opressão extraordinários, o que deita tudo a perder.
EM QUE GOVERNO OS TRIBUTOS SÃO SUSCEPTÍVEIS DE AUMENTO
Podem-se aumentar os tributos na maior parte das repúblicas; porque o cidadão que crê pagar a si próprio, tem vontade de os pagar, e tem ordinariamente esse poder por efeito da natureza do Governo.
Nas monarquias podem-se aumentar os tributos; porque a moderação do Governo pode procurar riquezas; é como que a recompensa ao monarca, pelo respeito que ele tem pela lei. No Estado despótico, não se pode aumentá-los; porque não se pode aumentar a extrema escravidão.
BREVE BIOGRAFIA DE MONTESQUIEU
Charles de Secondat, barão de La Bréde e de Montesquieu, ilustre escritor francês, nasceu no castelo de La Bréde, perto de Bordeaus, em 1689, e morreu em Paris em 1755. Seguiu a carreira da magistratura, que depois abandonou pelo estudo solitário e desinteressado. As "Lettres persones, 1721, tornaram-se subitamente célebres; são uma sátira às instituições e costumes do tempo. Passado algum tempo, Montesquieu empreendeu várias viagens para melhor conhecer os homens e as instituições. Voltando à França, retirou-se para o castelo de La Bréde, onde escreveu as célebres "Considerations sur les Causes de la grandeur et de la decadensce des Romains", 1734; era um fragmento da obra monumental a que dedicara toda a sua vida e que apareceu em 1748: "L'Esprit des lois." O Espírito das Leis.
Nicéas Romeo Zanchett
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